22 outubro 2007

Ocaso.




Uma praia tranquila, fim de tarde.
Três amigos sentados na areia, descalços.
Ana, Pedro e Lúcia.
Ana achou que o pôr do sol era a coisa mais linda que ela conhecia.
Lúcia preferia o nascer do sol, que dificilmente via.
Pedro gostava da lua, não se importava muito com os movimentos do sol.

Ana- É que ficam umas cores tão bonitas, e diferentes.
Lúcia - No nascer do sol, as cores são frias, azuis, e minha cor preferida é o azul.
Ana - No ocaso ficam vermelhas, laranja, e ali olha..uma nuvem lilás! Eu adoro lilás.
Pedro - Eu gosto da lua.. cheia, nova, minguante, crescente... Eu queria morar lá.

Riram

Ana- Lá é solitário
Lúcia- Aqui também
Ana-Quem você levaria pra morar com você na Lua, Pedro?
Pedro- Hum... vocês duas..minha mãe, meu pai, meu cachorro, minha irmã, meu irmão...a Luana apaixonada por mim...levaria também a Bia, o André, o tio Vitor..
Ana- Ah, muita gente, lá vai ficar como aqui.
Pedro- É.. é melhor eu ficar aqui. Lá eu moraria na lua mas não a veria.
Lúcia-Tem certas coisas que só nos encantam de longe.
Ana - Tem certas coisas que só nos encantam quando não as temos.

Silêncio

Ana-É melhor ter as coisas ou viver encantada?
Lúcia- Não sei.
Pedro-Humm... difícil dizer.
Ana e Lúcia - É.

Ana começou a mexer na areia,juntando montinhos úmidos, contruindo algo

Pedro-Vai fazer um castelo?
Ana-Não sei, vou moldar a areia e decidir enquanto isso.

Lúcia começou a escrever seu nome na areia, bem desenhado.

Pedro pegou conchinhas e pedrinhas e ficou atirando longe.

Mas as pedrinhas acabaram.

Lúcia derrubou o castelinho que Ana fazia e Ana apagou com o pé o nome de Lúcia na areia.

Riram.

Pedro- Alguém já destruiu seus planos algum dia, Ana?
Ana- Já... Não por maldade, mas por indiferença. Planos que envolvem outra pessoa são destruídos mais cedo ou mais tarde.
Pedro- Você já foi esquecida , Lúcia?
Lúcia- Já. Logo por quem eu sempre desejei que lembrasse de mim pra sempre.
Ana- E você Pedro? Algo em você já acabou?
Pedro- Não. Ainda há um pouco de cada coisa.

Se olharam os três e sorriram.

Pedro- Vocês são felizes?
Ana- Não sei.
Lúcia-Não.
Ana e Lúcia- E você?
Pedro-Acho que sou.
Lúcia-Por quê só eu tenho certeza?

Sorriram.

Ana-O sol se pôs.
Pedro-Não foi tão bonito.
Lúcia-Está escuro.
Ana-E frio.

Noite.

15 outubro 2007

O Sonhador


O que ele mais sabia fazer na vida era sonhar.
Sonhava de dia, iluminado pelo sol e sentindo calor.
Sonhava de noite, no escuro e olhando o céu sem estrelas.
Sonhava no inverno, no verão, em todas as estações.
Até nos anos bissextos sonhava.

E um sonho só, ele sonhava.
Todos os outros desejos não importavam, eram vontades apenas
Mas sonho era um só.
O mesmo, sempre.

Exatamente o único que não se realizava.

E lutava, corria atrás, como diziam nos filmes.
Cuidava dos jardins, regava o sentimento.
Buscava a excelência.
Se fazia merecedor.
E nada ainda.

O Sonhador se angustiou.
O tempo estava passando, as noites, os invernos.
E nada.

O Sonhador sentiu que sonhar era bom quando o sonho se realizava
Dentro de um certo tempo.
Mas quando se passavam anos, décadas... virava pesadelo.

E como esquecer o sonho?
Como desistir?
Ele não sabia, pois sonhar foi tudo que fez a vida toda

O Sonhador quis morrer, levar consigo o sonho.
Mas pra onde? O perseguiria.

Ele nunca deixava de receber golpes, o Sonhador
Todo dia, todo agosto, todo Natal.
Todo pôr-do-sol o Sonhador sofria.

Vendo seu sonho se realizar em outros, a todo momento.
Seu sonho era possível apenas a estranhos, nunca a ele.
E ele sabia que os outros não sonhavam.
Eram vontade, desejos, realizados.

O Sonhador achou a vida cruel, o sonho cruel.
Se sentiu cruel por sonhar.
Mas estava lá ainda, o sonho, implacável
E imutável, pois vinha do coração.

O Sonhador sonhou até o último dia de sua vida.
Passaram-se mais anos, mais décadas, tantos verões.
O Sonhador se curvou e perdeu o brilho dos olhos.
Ficou velho, doente, fraco, amargo, mau e feio.
Definhou.
E morreu o Sonhador, com desejos e vontades realizados.

Mas O Sonho, jamais.