27 novembro 2006

Blá Blá Blá

_Vai escrever sobre o que hoje?
_Não sei ainda... acho que... não, não sei.
_Escreve sobre como você está se sentindo hoje!
_Não quero ser repetitivo.
_Escreve sobre esse sentimento geral de solidão!
_Geral?!
_Já escrevi demais sobre a solidão.
_Escreve sobre o amor então.
_Já escrevi demais sobre o amor...
_Sabe, eu acho que falar de amor nunca é demais..
_Não escreve então!
_Já não escrevi demais.
_Fala sobre o Natal, tá chegando...
_Ainda é cedo.
_Mas vai falar depois?
_Se houver o que falar...
_E se não houver?
_Não sei.
_Não sabe?
_Não sei.. adoro não saber.
_Humm...
_Fala sobre..
_Fala ou escreve??
_É só modo de dizer...
_Mas está errado!
_Não está!
_Escreve sobre o que é certo ou errado.
_Escrevo um blog, não uma bíblia
_Ah.
_Eu acho errado falar de boca cheia.
_Se for algo necessário, eu acho certo.
_Espirra comida nos outros.
_E daí? É só limpar!
_É chato, nada pode ser tão urgente que não dê tempo mastigar e engolir.
_Pode.
_Escreve sobre falar de boca cheia!
_Já escrevi demais sobre bobagens.
_Isso não é bobagem!
_Pra mim é.
_Você escreve pra si ou pros outros?
_Escrevo pra quem quiser ler, eu sempre quero. Sou leitor garantido.
_E se ninguém valorizar o que você escreve?
_Não valorizam coisas mais preciosas em mim, e nem por isso desisti.
_Vai escrever sobre o que hoje afinal?
_Sobre meus devaneios, questões internas e perguntas bobas.
_Como começa?
_Já terminou.
_Ué! Já?? Aonde termina??
_Aqui, nesse ponto final.

15 novembro 2006

Passageiros

A mulher sentada à direita no ônibus leva um sorriso sereno no rosto, seu rosto brilha oleosamente. Ela traz no colo, protegido pelas mãos em concha um presente pro seu amor.
Ela sorri porque sabe que ele irá aceitá-lo, e aceitando seu presente, a aceita também.

O menino sentado olhando a janela tem os olhos muito abertos, admirando a paisagem.
Quer esquecer a bronca da mãe por ter quebrado sua boneca de louça, quer esquecer que está indo ao dentista.
No momento ele mal pisca e só vê a paisagem à frente, como se fosse a primeira vez.

O velho calado sorri quando algum passageiro se levanta e passa por ele. O sorriso é simpático e cúmplice. Ele sente dores nas costas, mas nesse momento ela é aliviada por uma sensação de família. O velho acha que seus colegas de viagem são seus, o amam e respeitam.

À esquerda está um jovem de cabelos lisos e castanhos, de braços cruzados e pernas bem abertas, está de olhos fechados porque acha a viagem um saco, quer chegar logo ao seu destino e encontrar a bela namorada que o espera de vestido novo. Sua bagagem é uma mochila com roupas e cds, e um violão numa capa preta, em cujo bolso está a letra de uma canção que ele fez para sua amada.

Nas últimas poltronas uma jovem pálida e loira morde os lábios. Está indo sozinha tentar um emprego em outra cidade. Não sabe fazer muita coisa mas tem muita vontade de aprender a fazer tudo. Acha que sendo humilde conseguirá que as portas se abram para ela. Bebe goles de água de uma garrafinha que carrega o tempo todo, seu maior tesouro.

Outra jovem com pesada maquilagem está na outra extremidade. Já retocou inúmeras vezes o rímel negro dos olhos, pois ela chora muito. Tem unhas compridas e bem cuidadas e cabelos negros muito brilhantes, as longas mãos apertam uma pequena bolsa de onde saem lenços.
Ela não leva mais nada além de uma carta dentro da bolsa. Ela espera que seus familiares a entendam e não sofram tanto.

Um homem de meia-idade está satisfeito consigo mesmo, pois considera-se um excelente pai de família, excelente funcionário e muito esperto. Às vezes se sente culpado pela aventura extra-conjugal que tem, mas ao mesmo tempo consola-se por saber que seus amigos o apóiam, a sociedade o apóia e seus filhos ficariam orgulhosos dele. Ele realmente se acha muito esperto.
Às vezes sorri sozinho e se vira para observar algumas passageiras.

Há outra passageira, uma jovem de ar competente e profissional. Tem nas mãos uma agenda em branco. Não escreve porque desistiu. Não quer olhar a paisagem porque cansou.
Não quer conversar porque não suporta seus companheiros de viagem. Não quer dormir porque não tem sono, nem fome, nem nada. Não faz uma ligação pra alguém porque não há ninguém que esteja esperando uma ligação dela. Ela apenas está ali. E se sente muito infeliz.

São passageiros os amores, os presentes, as paisagens, os sorrisos, as lágrimas, as dores, a água, os lenços...