28 dezembro 2009

Prece de Ano Novo

Não é por estar em tempos de segredos revelados que vou dizer oficialmente que o meu eu-obscuro e perverso já está todo animado para voltar a amar.
Já escolheu a vítima como o vampiro atrás do carvalho na floresta cheia de fumaça.

Pois eu trato de jogar a luz de um farol nessas trevas de amor suicida, ou de suicida não-nunca-jamais correspondência.

Logo agora que quero ter um rosto suave.
Amar nesse momento, só com garantia, fiador, interesse mais alheio do que meu.
Se não for assim não deixo mesmo, piso na flor nascendo, cavo pra arrancar a raiz se preciso.

Até porque nem posso, tento explicar ao meu eu-insano-kamikaze, que meu médico disse que estou convalescente de amores e paixões devastadores, cuja cura ninguém sabe, mais poderosos que vírus achados em macacos e animais silvestres de algum recôndito das florestas africanas.

No calor do fim do ano, quero, preciso, procuro, alguém para amar/abraçar, como se eu estivesse no frio ártico. Mas é um estado de transe, esses muitos sininhos e blim-blons que tocam essa época do ano deixam a gente assim.

Segredo eu posso compartilhar, não revelar gratuitamente: pedi a um risco de luz no céu, que chamei de estrela cadente mesmo sem saber se era, que meus olhos brilhassem apenas de amor e não mais de lágrimas de dor e abandono.

Então eu serei um só, sem obscuridades e brilhando mais que essas luzes que enfeitam a cidade.

11 dezembro 2009

Feliz Ano Novo



Um dia nublado como hoje é minha deixa: passou a anestesia do sol que por me efervescer, me deixa não-pensar naquele corte lá no pé que vai doer quando eu parar e o sangue esfriar.

Pois bem, as nuvens cinzas chegaram e eu parei. E que dor aguda me sobe pelo corpo.

Lembrando de quando eu arrumava mochila e ia dormir fora: hoje só reconheço minha própria cama. Na falta de portos seguros, faço de mim um ancoradouro que ninguém sabe que existe, encoberto que está de vegetação alta.

Lembrando dos amigos que sumiram por aí: uma que deve estar feliz, outro que me disse "vou embora, não estarei aqui quando você me procurar", outros e outras cujos telefones eu sabia de cor.

Os belos pagam com a superficialidade, os inteligentes com a solidão e os puros de coração com a crueldade da vida.
Lembrando de pessoas bonitas, sábias e puras em dia de céu cinza e diante do mar: pareço estar em outra cidade. Não pela paisagem, mas pela possibilidade de viver.

Lembrando da velha atriz que ficou feia e hoje despreza a humanidade; muitos caminhos percorremos se nos decidimos a viver 24hs por dia e não apenas uma parte disso.

Não sei exatamente onde me cortei, mas poderia descobrir facilmente se eu quisesse.
Sei que sempre sou eu que escuto o "vou embora" e sempre sou eu que perco de vista o vulto indo no horizonte ou na estrada e volto pra minha infeliz rotina.

Sempre dou as costas depois, sempre sou o primeiro a chorar e o último a sorrir.
Sempre corto meu pé no vidro que alguém jogou e sempre morro todo dezembro tragicamente ao som de uma música natalina.

Sempre começo o ano mais velho e mais duro: sempre sou eu que lembro que todos os pedidos que fiz à meia noite do ano anterior não foram realizados nenhum e resolvo tentar e fazê-los novamente como um jogador viciado na loteria.

Em segundos tenho que fazer curativo no corte porque não posso deixar uma trilha de sangue por onde eu andar: as pessoas tem que estar confortáveis para me dizer "adeus" em alguma curva do caminho.

19 outubro 2009

Às Noites


As noites andam dizendo que é preciso terminar de amar.
Abrir os olhos durante a madrugada , fitar o teto branco e impiedoso, apenas ouvir a própria respiração.
A noite diz: sozinho.

É preciso pegar o medo de viver e suspendê-lo acima da cabeça: fora do alcance da nossa própria visão.
Salvar a doçura dos pés que a pisam: carinho é como uma frutinha que fácil se esmaga.
Muito suco desperdiçado.

A noite sopra ventos frios vindos de todas as direções, principalmente do norte.
É preciso se abraçar: solitário gesto de envolver os ombros com as próprias mãos.

A noite reclama: quero choro ou riso , nunca o silêncio.
É preciso silenciar: a noite não pode ser dona dos olhos e bocas.

A noite chama para dormir. É preciso acordar, atrevido, fitar o teto, ouvir o soluço.
As noites mandam, dizem, pedem, clamam, gritam.

É preciso manter a calma: sozinho, a gente termina o amor que nunca devia ter começado.

20 setembro 2009

Balelas

_É rapidinho: me diz como é estar apaixonado.
_Ah, não sei dizer, fica tocando música na sua cabeça o tempo todo
_E isso é bom? como consegue dormir?
_É bom sim, são sempre músicas bonitas, e quando você dorme, sonha com elas.
_Mas é porque você é muito romântico né?
_Sou sim, o tempo todo
_Eu não sou.
_O que você sente quando ama alguém?
_Te perguntei justamente pelas minhas dúvidas, mas você é romântico e eu sou da galera do realismo-fantástico.
_Não entendi... como é isso? É tipo como na literatura..?
_Não, é diferente... mas é inexplicável, se eu conseguir explicar, serei um romântico como você.
_Então na sua cabeça não toca música.. é isso?
_Toca... música tipo de desenho animado, e sempre penso que vou levar uma topada e cair.
_Que diferente.
_Sim, muito, isso é ser realista-fantástico.
_E é bom ser isso?
_Eu acho bom... se você quiser saber como é , vai na reunião do nosso clube, é dia de quarta feira...
_Ah, tem reunião? vocês são organizados né... nós românticos não somos.
_É, vocês são cheios de problemas.
_Bom, tenho que partir.
_Eu também, lá vem meu ônib .. ops meu cavalo azul alado que me levará a montanhas distantes de terras onde tudo é amor de verdade.
_Puxa, me dá uma carona então??
_Não seu bobo, isso não existe! Toh brincando né...
_Puxa vida...por um momento eu pensei...
_Não chora cara.... olha chegou teu ônibus... cuidado!!! olha, sujou você de lama.
_Tudo bem.. tchau
_ Tchau né.

16 setembro 2009

Bi-Bi


É um exercício escrever a essa hora: são 17:31h.
É hora de passagem, de pegar toalha pra banho, de sentir o cheiro da sopa do jantar, e o som das pessoas na rua saindo de seus trabalhos.

É aquela hora que a gente só termina as coisas.
Mas eu vou começar a escrever um texto. Agora, nessa hora incoveniente.

Lembrei que no Natal, as luzes que enfeitam a cidade começam a brilhar a partir dessa hora.
Sempre achei que seria impossível para mim escrever (pensar criar) algo nessa hora.
Mas são 17:35 (que bonito número).

Que estou sentindo além da aflição de escrever a essa hora?
Já sei: essa não é a minha hora de sentir saudade, amor, paixão, solidão, tristeza, ânimo, paz nem alegria.
É uma hora de não-sensações, é a hora de ações robóticas.

É pra declamar palavras como "departamento" "tráfego" "pedestres" "atraso" "fechadura" "chave" e "correria". É também hora de se ouvir buzinas e assobios.

Pronto, escrevi sobre um caos lá fora e que eu não acompanho.
Meu caos é em outra hora, agora sou um ser racional que sabe que tem que tomar banho, jantar e ir pro meu compromisso de todas as noites.

17:42.
Sem poesia.
Ufa!

12 setembro 2009

Moinho de Vento.

O que estou tentando dizer é que as canções não bastam.
As leituras que fazemos nem os filmes que assistimos.
Falta muita coisa

É ilusão se sentir entendido: na verdade o que reina é a dúvida.
A Infinda Luta do Cavaleiro Solitário Em Busca da Felicidade no Reino da Dúvida.

Só que não é luta propriamente, nem sou propriamente um cavaleiro nem solitário nem buscando a felicidade.

Não busco nada, estou voltando olhando pro chão porque perdi algo que caiu do meu bolso.
O que há de solidão nisso tudo é que lutar para ser feliz é algo que se faz sozinho.

Certo, falarei por mim então. Luto sozinho para ser feliz.
Não sou um lutador, já disse, nem solitário. Nem feliz.

Sou é personagem mítico no Reino da Dúvida, porque tenho cá umas certezas.
Camponeses me vêem à noite vagando em bosques e por entre as paredes de castelos.

Sigo um fio agora: as canções não bastam porque só despertam dragões que deveriam viver adormecidos por forte sossega-leão.
Mas imprudente eu canto e eles acordam, dragões-paixões, bichos de um mundo além do sensível, monstros que depois me devoram nas noites que passo em claro pensando nos novos rostos e nomes.

A Não-Luta do Não-Cavaleiro Não-Solitário Na Não-Busca da Não-Felicidade.
É assim que a história deveria se chamar.


29 agosto 2009

Nada


Uma caixa vazia
Um campo de futebol à noite, deserto.
O deserto à noite.
Um céu sem estrelas
Uma manhã sem nuvens

O mar calmo.
Paz?
Não, é apenas a vida sem a gente estar nela.

Aqui, um suspiro. Tudo menos alívio.
Tua foto não me faz nem piscar, nada mais.
Foto nenhuma , lembrança alguma, encaro o nada como um cego.

Outro suspiro, e haverão outros e mais outros
Até o fim.

Um envelope sem carta
Um buraco no estômago, a fome.

A lágrima se desprende do olhar como quem escapa de uma prisão
E vai rolando, sozinha, como se esperasse ser seguida por outras

Mas não, é sozinha também, a lágrima do solitário.

É o olhar pra trás e não ver ninguém.
Nem na frente, nem do lado, nem dentro nem fora.

Aqui, um suspiro. Dessa vez mais longo e com um soluço no final.

06 junho 2009

Assunção


Para esquecer você eu faço descobertas
Descobri por exemplo, que sou artista mesmo e não tem jeito

Me emociono só de falar de arte e fico grato por chorar sem ser por você

Pelo menos um momento, uma noite.


Para esquecer as loucuras que um dia fiz, penso na serenidade que sinto quando durmo e meu travesseiro é novo.
Um prazer que não é de lembrar de teu rosto.

Teu rosto, já praticamente esqueci, porque gasto neurônios
memorizando outras coisas
.
Versos, poesias de Drummond.

Para matar você da minha vida, eu me faço viver.

É uma troca, eu vivo, você morre. bem assim, claro e dinâmico.

Eu vivo nem que seja morrendo e cansando, soluçando e engolindo seco.

E você não sei se de verdade vive ou morre, pra mim você se apaga.


Só lembro de você mesmo na hora de esquecer
.

Só estarei no paraíso tomando leite e mel quando não houver o que esquecer, quando tudo for surpresa de criança, quando aos meus pés estiver pintado um marco-zero, mesmo que seja de sangue ou lágrimas, mas não pisarei porque meus pés estarão no sublime, subindo escadas e já vislumbrando luzes que vêm de Deus.

Milagre.

25 março 2009

Outono

Nasci por uma infelicidade entre aqueles que não sabem viver impunemente.
Não sou desses que andam por aí felizes a qualquer custo.
Sou (que droga) daqueles que param e pesam, refletem, ou seja, sofrem.Mas sofremos tentando a felicidade, nem que seja por um milésimo de segundo.

Agora estou num doloroso (mas libertador como costuma ser) processo de morte.

Eles estão morrendo: os amores teimosos, umas esperanças, muito carinho, alguma sensibilidade, algumas amizades, muita tolerãncia, muita paciência, bastante da resistente ingenuidade, algo de doce, algo que canta, aquele sorriso que dei a alguém, aquele piscar de compreensão, morrendo, uns repentinamente, outros agonizam por horas, dias.

Agora entendo (sinto) como as árvores vivem no outono, vendo suas folhas secarem, caírem, morrerem, se sentem cadáveres também.
Não quero pensar em primavera ainda, morreu muita esperança, a que acreditava na primavera está morre-não-morre. "Não sabemos se resistirá" dizem os médicos com pesar.

É outono agora, com licença aos ainda queridos, é outono e preciso de espaço, de ar, de tempo e de lenços de papel.

18 fevereiro 2009

Do Zero

Tem gente que anda por aí reclamando de falta de amor.
Fico pensando em quem amei e nunca aceitou o meu amor.

Pois acabou.
Na multidão caminham pessoas que poderiam ter recebido flores e beijos e carinhos e surpresas e poderiam ter tido contato com uma determinada felicidade, mas não quiseram.
Sendo assim, espero nunca precisarem, pois de mim não sairá mais nada.

Fiquei ali, entre um hiato ou outro de existência, esperando o ritmo voltar à constância e eu iniciar meu caminhar. Porque caminho num ritmo: o ritmo da esperança. (Esses amores mudaram a métrica e ficou impossível acompanhar , então tropecei e caí).

Mas já de pé, ando com as armadilhas ficando pra trás. É a grande vitória das feras que escapam de seus perversos caçadores. O saber onde pisa.

As pisadas são mais duras. Infelizmente, perderam aquela certa leveza. Estão carregadas de um rancor que empurra pra frente. Os passos são rígidos de tristeza e mágoa. É como uma mão invisível nas costas que diz "VAI!"

E vou.
Logo adiante as lágrimas secarão, o ódio que antes foi amor se esfriará, a mágoa ficará indelével, os passos podem ficar mais leves, a memória de quem não quis meu amor ficará distante e minha vingança será o meu sorriso no rosto, como quem diz :"Eu tentei" .

02 fevereiro 2009

Triste E Livre Amor


É uma declaração de amor que te faço, mas o amor é tímido.
Tímido porque anda na ponta dos pés para não ser percebido e assim, aniquilado.
Porque é assim que os (meus) amores acabam.
Mortos por ti.

Mas esse é passarinho, voa, é abelha, é coisa alada
Escapa mais porque sou sombra e meu mistério oculta esse sentimento-menino e suas travessuras.

Meu amor por ti me trouxe uma breve (e clandestina, citando Clarice) felicidade.
Breve porque os próprios sonhos são breves, se o doce se vai numa mordida, se a flor murcha em poucos dias, porque minha felicidade que anda na corda bamba não haveria de ser?
E clandestina porque eu não tenho direito a senti-la , uma vez que é ilusão, uma vez que não existe tal motivo.

Mas sou como aqueles que habitam em secreto os porões dos navios, venho de terras estranhas e desembarco em portos que não sei. Sou proibido.
E desse amor-que-não-tem-sentido-de-ser brotam sorrisos. Sorrisos leves, passageiros, mas sorrisos.

Ah, meu amor, a felicidade é um bem que possuo numa caixa que tu tens a chave.
Como posso te pedir "abre-a"?
Se bem sei que teus olhos têm outras cores, teu coração navega em outros mares?!

É pela esperança então.
É pela esperança.


15 janeiro 2009

Ímpeto.

Sofro sem viver.

É como aquela criança que não brinca enquanto vê as outras rolando na grama, inventando mil travessuras, caindo e se machucando.
Choram, vêem o sangue no joelho ralado, mas brincaram.
Eu sou a criança que tem os joelhos em carne viva sem ter brincado.

Sou o banhista que nunca foi até o fundo e quando vai, é queimado por uma água-viva.
Volto em pânico. Fui castigado.

Sou quem dormiu de dia e acordou de noite: e agora? dormir mais ou ganhar as ruas?
Sou quem ganhou as ruas e foi assassinado numa esquina escura.

Mas antes de tudo sou aquele único sobrevivente do terremoto
Minha mão aparece sob os escombros.
Transformando meu espanto de viver em força de existir
E sorrindo, o ato mais heróico.


12 janeiro 2009

Um Ausente.


Onde você fica?
No passado ou no presente?
Foi o brilho dos teus olhos que causaram as tormentas dos mares que naveguei.
Naveguei não, fui levado, na frágil balsa da esperança, tocando de vez em quando a água com a ponta dos meus dedos semi-mortos.

Dessa vez meus olhos que brilham, porém.
Em terra firme, fico quieto.
Temo as corujas, que trazem mau agouro, mas há o fascínio .
Adoro corujas.

Onde você fica? No presente?
Não há lugar para você nessa terra firme em que estou pisando, e se tu estivesses aqui eu afundaria num terremoto ou na areia movediça

Tu me fazes perder o chão.

E me dói saber que "tu" já nem és mais uma pessoa, que poderia retroceder na sua crueldade infantil de ter vontades.
Tu és hoje uma sensação, um déjà vu, hoje és para mim a memória de uma fome, de uma sede, de um precisar.

Não sei onde tu estás.
Não sei se quero saber.
Não sei se desejo que voltes ou que desapareças para sempre.
E como tu não és mais pessoa, outros "tu" virão.
Ou já vieram e "tu" já tens outro rosto.

Se eu já não amo a ti, eu amo a necessidade que eu tenho de ti.
Eu amo meu egoísmo de querer um afago, eu amo a mágoa e amo o perdão.
Onde eu estou?

Em algum lugar seguro de terremotos ou minha alma jaz no fundo do mar?
Só tenho agora a memória do brilho dos teus olhos.
E os olhos, meus, brilhando por ti, por mim e por tudo.