23 março 2011

Suspense

Às vezes fico aqui, paradinho, brincando de estátua
No escuro, com a respiração presa.

Porque espero passar.
A dor, o ônibus, os homens.

Chamo de pausas. Aquele silêncio que vem depois de uma má notícia.
Tenho muito disso.

Prefiro levitar alguns segundos, me ausentar da vida, como um botão de off.

Medo de ser julgado, medo de assustar alguém com barulho, medo de ser visto pelo cão raivoso.

Mas principalmente porque quero preservar uma florzinha toda frágil feita de poeira.
Ela é um amor que tenho não sei de onde, nem porque, nem por quem, nem como sobrevive aos furacões que faço no chão quando ando.

19 março 2011

Apenas Você



Gota a gota
Chuva de espinhos
Cristais que quebram em minha testa

Água, sangue, lágrimas
Tudo chove em mim

A lembrança de tua voz, cheiro e cabelos, me tangem como um violino triste, agudo de morte.
Dores, calafrios subindo.

Você tem a mania de olhar para o pôr do sol e sorrir pensativamente
Eu nas sombras, observo e choro, distante e suspenso

Flechas e flechas de amor e dor me atingindo nos órgaos vitais
De índios, não de cupidos.

Quando você se volta, me vê inteiro e banhado de azul da recém noite
E você ainda conserva a luz amarela do sol, ele lhe deu esse presente.
Nós dois, azul e amarelo, sombra e luz.

Quando eu te conheci, eu andava num ritmo cadente, levando livros na mão
De noite, abria minha janela e olhava a única estrela não encoberta de fumaça e luz artificial e inventava minha própria história de amor.

Na manhã seguinte, você me fazia rir com gosto, fechando meus olhos, que são grandes, criando covinhas e eu sendo gracioso por uns instantes.
Eu gargalhava o dia todo, abotoando com carinho algum botão da minha ou da sua roupa.

Mas eu sabia porque nasci sentindo as coisas fatais
Que me fazendo rir uma ultima vez, você ligaria o motor e partiria rapidamente, cabelos ao vento
E eu equilibraria no olho a lágrima.

E voltaria à realidade onde nem palhaços me fazem sorrir e às minhas histórias cada vez mais repetitivas e doentes sobre amor, janelas, única estrela e solidão.

Até que finalmente eu me renderia à mais mortal das certezas:
A dúvida se amanhã você viria me fazer rir ou chorar, não importava.
Contanto que viesse.

Você ou outra pessoa que me fizesse perder o gosto por histórias
E ser alguém feliz e sem imaginação.
Esse é meu sonho.

09 março 2011

Dúvida.


Trago comigo todos os fantasmas que me assombram no decorrer do ano
Transformo em palavras o barulho das correntes que arrastam

Tenho vontade de sair simplificando o mundo, desbaratando os ecossistemas
Como alguém que tenta arrumar sua bagunça e destrói uma obra-prima
Isso tudo é porque: sou ser em conflito
Quero levantar questões e depois silenciar os protestos, pedindo paz.

Na verdade,
Acho tristes os homens muito belos
E as mulheres, o modo como falam com seus amores.

Sou desconfiado com os poetas ditos atormentados
Porque minha normalidade é tão serena que quero explodir vez em quando

Em anos ímpares, quando o amor não rege minha ordem natural das coisas, fico assim.
Desapercebido, bobo, alerta no momento errado.

Me calo quando alguém diz "a idade chegando"
Ou
"O tempo voa".
Me calo magoadíssimo com esse diluir de anos, essa roda viva.
Baixo os olhos, cínico e inconformado.
Mas incapaz de gritar, ou de rejuvenescer.

Transbordo de perguntas, a principal delas diz respeito ao amanhã:

O que vou fazer caso meu conflito acabe, antes mesmo de eu terminar de inventa-lo?