Vento frio, sol lá fora.
E penso: "como pode?"
Mas sei que é algo comum de acontecer, eu é que apenas hoje parei pra perceber, ou minha pele está ao avesso e sinto mais as coisas porque a parte sensível está exposta.
Portanto soube o que é comum às manhãs.
Imediatamente me cubro novamente, porque é grande o risco de infecção.
No ar flutuam seres invisíveis que a biologia põe nomes estranhos e eu simplifico: perigosos.
Seres perigosos a mim, que ando com a imunidade baixa desde que chorei de susto por saber que a vida é, simplesmente.
E por a vida simplesmente ser, é preciso estar com todos os poros desobstruídos e o sangue quente, fino e vermelho para quando o corte, termos dignidade ao sangrar.
Hoje já sangrei, cortado pelo vento frio.
Por a vida ser, e ventar frio e o ar estar infestado de seres perigosos pra mim, é que contraditoriamente, passo a descansar e relaxar: é coisa demais para lutar contra, e como diz a música: "I ain't gonna study war no more" e batalha inútil é batalha vencida.
Pronto, o vento deixou de ser frio, pois se aproxima o meio-dia.
Logo o céu estará daquele tom azul-falso-alegre tão comum na vida da gente.
Mas uma nuvem cinza teimosa continua no céu, pois assim como eu, ela sabe que não precisa mais guerrear nem chover, pois já venceu; já houve o vento frio, ele já me cortou e eu sangrei, e do sangue brotaram palavras aladas que eu amarro ao pé da minha cadeira, pois sou apegado a certos seres alados, invisíveis e perigosos a mim.