06 maio 2018

Requiem

Escalei montanhas e varei desertos para chegar nesta joia da verdade:
"Será num domingo."

A papelada que não li já dizia isso, estava nas linhas miúdas do contrato que assinei, estava dentro do biscoito da sorte que não abri:
"Será num domingo"

Estava o tempo todo debaixo do meu nariz, debaixo do meu travesseiro, escrito no espelho do banheiro:
"Foi num domingo"

Era isso que a mensagem na garrafa dizia, o pergaminho em sânscrito e o sonho que eu tive tentaram me avisar:
"Tem sido aos domingos"

Ignorei a marca das unhas na parede, os óculos sempre molhados de lágrimas, os cabelos arrancados deixavam claro:
"Será num domingo"

Essa parede branca implacável, a ausência de sons e a sensação de naufrágio não podiam se confundir:
"Tem acontecido aos domingos"

Diante de tantos sinais, não há o que se fazer, não quero fazer, ninguém pode fazer, as pessoas estão no sábado, ou também tem seus domingos, um domingo chama outro domingo e só quero que o domingo chegue logo, o domingo que o outro domingo chama, o domingo que os outros domingos preparam, o domingo que os outros domingos fazem a cama, tecem os bordados, mexem na panela, aquecem no ventre:
o domingo que finalmente cessará os domingos.

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